top of page

TJ SP - usucapião - soma de tempo de posse - posse comum?

  • Foto do escritor: Isabel Sangali
    Isabel Sangali
  • 13 de mar. de 2023
  • 7 min de leitura


ree

1ª VRP/SP: Usucapião Administrativa - Até que se formalize a partilha, a posse serÔ comum, não havendo como prestigiar um dos herdeiros com a soma do tempo de posse dos falecidos em detrimento dos demais.

Processo 1005637-03.2023.8.26.0100 DĆŗvida – Registro de Imóveis – Ronaldo Aparecido Felix da Costa – Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a dĆŗvida para afastar apenas a exigĆŖncia relativa Ć  necessidade de adequação do pedido em virtude de funcionamento de microempresa no imóvel usucapiendo. Deste procedimento nĆ£o decorrem custas, despesas processuais ou honorĆ”rios advocatĆ­cios. Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: VANESSA DE ALMEIDA NUNEZ (OAB 165057/SP) Processo Digital nĀŗ: 1005637-03.2023.8.26.0100 Classe – Assunto DĆŗvida – Registro de Imóveis Suscitante: 7Āŗ OFICIAL DE REGISTRO DE IMƓVEIS DA COMARCA DE SƃO PAULO – SP Suscitado: Ronaldo Aparecido Felix da Costa Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci EugĆŖnio Mahuad

Vistos. Trata-se de dĆŗvida suscitada pelo Oficial do 7Āŗ Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ronaldo Aparecido Felix da Costa Ć  vista de exigĆŖncia feita em procedimento pelo reconhecimento extrajudicial de usucapiĆ£o do imóvel objeto da transcrição n. 15.418 daquela serventia (prenotação n. 502.891). O Oficial esclarece que a parte adquiriu o imóvel pelo falecimento de seus genitores, passando a exercer posse exclusiva com anuĆŖncia de seus irmĆ£os e respectivos cĆ“njuges; que a parte pretende somar o tempo de posse de seus genitores; que, pelo princĆ­pio da saisine, os direitos relativos ao imóvel usucapiendo foram transmitidos automaticamente a todos os herdeiros, nos termos do artigo 1.784 do Código Civil, passando a existir concorrĆŖncia em relação Ć  posse do imóvel; que, atĆ© a partilha dos bens, o direito dos herdeiros, quanto Ć  propriedade e Ć  posse da heranƧa, Ć© indivisĆ­vel e regula-se pelas normas aplicĆ”veis ao condomĆ­nio (artigo 1.791, parĆ”grafo Ćŗnico, do Código Civil); que, entre 1992 e 2020, a posse exercida pelos genitores se comunica a todos os herdeiros, sendo vedado Ć  parte suscitada usar esse tempo como exclusivo de sua posse; que a parte suscitada passou a exercer posse exclusiva e qualificada quando da abertura da sucessĆ£o de seu pai, em outubro de 2020, de forma que a anuĆŖncia dos demais herdeiros só surte efeitos a partir desse momento; que o pedido de usucapiĆ£o deverĆ” ser requerido por todos os herdeiros ou a parte deverĆ” aguardar o implemento da prescrição aquisitiva em seu favor, jĆ” que seu tempo de posse exclusiva Ć© insuficiente para o reconhecimento de qualquer modalidade de usucapiĆ£o. O Oficial observa, ainda, que Ć© necessĆ”rio que a parte esclareƧa sobre a existĆŖncia de edificação, benfeitoria ou qualquer acessĆ£o no imóvel usucapiendo, conforme disposto no artigo 3Āŗ, inciso II, do Provimento n. 65/2017 do CNJ; que, em virtude dos documentos apresentados, constatou-se que no local funciona um estabelecimento comercial de titularidade da parte suscitada, motivo pelo qual Ć© necessĆ”rio que esclareƧa quem de fato exerce a posse do imóvel: ela própria ou a pessoa jurĆ­dica por ela administrada. Documentos vieram Ć s fls. 07/170. Em manifestação dirigida ao Oficial, a parte suscitada alegou que a existĆŖncia de edificação estĆ” confirmada pela própria descrição do imóvel constante da matrĆ­cula, da ata notarial, do requerimento de usucapiĆ£o e do material tĆ©cnico, nĆ£o sendo razoĆ”vel aguardar a comprovação de meras manutenƧƵes corriqueiras para aferir atos possessórios a legitimar a usucapiĆ£o; que a utilização do imóvel para fins comerciais nĆ£o prejudica a usucapiĆ£o na modalidade extraordinĆ”ria; que, com a anuĆŖncia, os herdeiros reconheceram a sua posse exclusiva, inexistindo condomĆ­nio entre eles (fls. 17/18 e 47/53). NĆ£o houve, porĆ©m, impugnação em juĆ­zo (fls. 15/16 e 171). O MinistĆ©rio PĆŗblico opinou pela procedĆŖncia parcial (fls. 175/177). Ɖ o relatório.

Fundamento e decido. Por primeiro, Ć© importante consignar que a existĆŖncia de outras vias de tutela nĆ£o exclui a da usucapiĆ£o administrativa, a qual segue rito próprio, com regulação pelo artigo 216-A da Lei n. 6.015/73, pelo Provimento n. 65/17 do CNJ e pela Seção XII do Cap. XX das NSCGJ. Assim, como a parte interessada optou por esta Ćŗltima para alcanƧar a propriedade do imóvel, a anĆ”lise deve ser feita dentro de seus requisitos normativos. No mĆ©rito, a dĆŗvida Ć© parcialmente procedente. Vejamos os motivos. O imóvel usucapiendo Ć© aquele descrito na transcrição n. 15.418 do 7Āŗ Registro de Imóveis da Capital, localizado na rua Tabajaras, n. 652, no 33Āŗ Subdistrito Alto da Mooca, nesta Capital, em que figuram como proprietĆ”rios tabulares JoĆ£o Paulo Marsiglia, Pedro Paulo Marsiglia e Carla Maria Marsigilia, os quais, em 28/04/1992, celebraram compromisso de compra e venda por instrumento particular com os genitores da parte suscitada (fls. 69/72 e 76/77). No caso, o que se pretende Ć© o reconhecimento de usucapiĆ£o extraordinĆ”ria com fundamento no artigo 1.238 do Código Civil: a parte alega posse por prazo superior a quinze anos quando somada ao tempo exercido por seus genitores, Marli Ribeiro da Costa e Rinoel Felix Costa, falecidos em 17/07/2012 e 24/10/2020, respectivamente (fls. 73/74). Em declaração datada de 15/11/2021, os demais herdeiros de Marli e Rinoel, Robson Felix da Costa e Magali Felix da Costa Renna, casada com JosĆ© Roberto Renna, deram expressa anuĆŖncia Ć  pretensĆ£o do usucapiente, afirmando que ele exerce a posse exclusiva do imóvel de forma contĆ­nua, mansa e pacĆ­fica hĆ” mais de quinze anos (fl. 79). Ocorre que, com o óbito dos antecessores, a posse foi automaticamente transmitida em favor de todos os herdeiros, que passaram a ser compossuidores, nos termos do artigo 1.784 do Código Civil (princĆ­pio da saisine). Assim, atĆ© que se formalize a partilha, a posse serĆ” comum, nĆ£o havendo como prestigiar um dos herdeiros com a soma do tempo de posse dos falecidos em detrimento dos demais, conforme decidido recentemente pelo E. Conselho Superior da Magistratura: ā€œREGISTRO DE IMƓVEIS – USUCAPIƃO EXTRAJUDICIAL – FALTA DE PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS – LAPSO TEMPORAL NƃO ATINGIDO PARA O RECONHECIMENTO DA USUCAPIƃO EXTRAORDINƁRIA – IMPOSSIBILIDADE DA SOMA DA POSSE PELO INSTITUTO DA SUCCESSIO POSSESSIONIS – AUSENTE JUSTO TƍTULO PARA A USUCAPIƃO ORDINƁRIA – RECURSO NƃO PROVIDOā€ (TJSP; Apelação CĆ­vel 1021331-35.2021.8.26.0309; Relator (a): Fernando Torres Garcia (Corregedor Geral); ƓrgĆ£o Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de JundiaĆ­ – 1ĀŖ Vara CĆ­vel; Data do Julgamento: 10/11/2022; Data de Registro: 18/11/2022). Apesar de o acórdĆ£o nĆ£o tratar de posse ad usucapionem, o relator tambĆ©m abordou a hipótese ora analisada: ā€œ(…) E ainda que se pudesse falar em soma da posse (successio possessionis artigos 1.207 e 1.243 do Código Civil), caso a exercida pela genitora fosse ad usucapionem, a recorrente nĆ£o poderia usar em benefĆ­cio próprio o tempo anterior ao falecimento de sua mĆ£e que, na verdade, beneficia a todos os herdeiros e nĆ£o a si pessoalmente. Na lição de Benedito SilvĆ©rio Ribeiro, ā€œcom a abertura da sucessĆ£o, a posse exercida pelo autor da heranƧa vai aos herdeiros independentemente de atos seus, mas incorpora-se a todos, nĆ£o podendo uns usucapir contra outros, somando a sua posse Ć  do antecessor comumā€ (Tratado de UsucapiĆ£o, 6ĀŖ edição Saraiva, vol I, p. 265) (…)ā€. Em outros termos, só se pode considerar que a parte requerente passou a exercer posse exclusiva, ininterrupta e sem oposição sobre o imóvel após a abertura da sucessĆ£o, em 24/10/2020, com o falecimento de seu genitor, momento a partir do qual passou a ser vĆ”lida a anuĆŖncia manifestada pelos demais herdeiros. Dessa forma, a parte poderia pleitear a prescrição aquisitiva em seu nome, sem considerar o tempo de posse de seus genitores, desde que estivesse exercendo posse exclusiva sobre o imóvel hĆ” mais de quinze anos, o que nĆ£o Ć© o caso, jĆ” que assim a tem hĆ” aproximadamente dois anos e meio. Entretanto, a soma da posse da parte suscitada Ć  dos genitores serĆ” possĆ­vel se realizada partilha dos direitos sobre o imóvel e os demais herdeiros renunciarem Ć  heranƧa por instrumento pĆŗblico, tendo em vista que, neste caso, nĆ£o ocorrerĆ” a transmissĆ£o da heranƧa aos renunciantes, nos termos dos artigos 1.804 e 1.806 do Código Civil. Note-se que, no julgado mencionado pelo MinistĆ©rio PĆŗblico, nĆ£o houve a soma da posse da herdeira recorrente Ć  de seus genitores, mas, sim, Ć  posse dos demais herdeiros, que a exerceram em conjunto a partir do falecimento do genitor, em 2014, atĆ© o momento em que foi celebrado entre eles o instrumento particular de compromisso de cessĆ£o de direitos hereditĆ”rios e outras avenƧas, em 2016 (Apelação CĆ­vel n. 1010746-36.2020.8.26.0477 fl. 176). TambĆ©m assiste razĆ£o ao Oficial no que toca ao óbice relacionado Ć  indicação da existĆŖncia de edificação, benfeitoria ou qualquer acessĆ£o no imóvel usucapiendo, com referĆŖncia Ć s respectivas datas de ocorrĆŖncia, justamente para que sejam demonstrados eventuais atos praticados pela parte suscitada durante o perĆ­odo de posse alegado, conforme estabelece o artigo 3Āŗ, inciso II, do Provimento 65/2017 do CNJ, e o item 416.1, II, do Cap. XX das NSCGJ. No que diz respeito ao funcionamento do estabelecimento comercial de nome ā€œLA BAMBA TEX MEXā€ no imóvel usucapiendo desde 01/03/2008, nĆ£o subsiste a exigĆŖncia de que a parte suscitada deve adequar o pedido a fim de que a microempresa requeira o reconhecimento da usucapiĆ£o, caso ela exerƧa a posse do imóvel. Conforme se observa da ficha cadastral da JUCESP, trata-se de microempresa de titularidade da parte suscitada, cujo nome empresarial Ć© Ronaldo Aparecido Felix da Costa ME (fls. 07/13). Embora tenha CNPJ para fins tributĆ”rios, o empresĆ”rio individual nĆ£o Ć© considerado pessoa jurĆ­dica, de forma que a empresa Ć© explorada pela pessoa fĆ­sica, em seu Inexistindo personalidade jurĆ­dica autĆ“noma e, consequentemente, separação entre o patrimĆ“nio do empresĆ”rio e da empresa, esta nĆ£o pode adquirir bem imóvel, razĆ£o pela qual nĆ£o Ć© parte legĆ­tima para requerer a usucapiĆ£o: ā€œREGISTRO DE IMƓVEIS – ESCRITURA DE VENDA E COMPRA – EMPRESƁRIO INDIVIDUAL – FALTA DE PERSONALIDADE JURƍDICA – IMPOSSIBILIDADE DE INGRESSO NO FƓLIO REAL – PRECEDENTE DO EGRƉGIO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA – RECURSO DESPROVIDOā€ (TJSP; Apelação CĆ­vel 0001274-92.2014.8.26.0362; Relator (a): Elliot Akel; ƓrgĆ£o Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de Mogi GuaƧu – 1ĀŖ Vara CĆ­vel; Data do Julgamento: 15/09/2015; Data de Registro: 24/09/2015). Vale observar, por fim, que a exploração da empresa no imóvel usucapiendo entre 2008 e 2020 se deu por mera tolerĆ¢ncia dos antecessores, que permitiram, tacitamente, a utilização do local pela parte suscitada, de modo que a posse nĆ£o pode ser entendida como ad usucapionem, notadamente porque ainda nĆ£o existia animus domini (artigo 1.208 do Código Civil fls. 142/156). Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a dĆŗvida para afastar apenas a exigĆŖncia relativa Ć  necessidade de adequação do pedido em virtude de funcionamento de microempresa no imóvel usucapiendo. Deste procedimento nĆ£o decorrem custas, despesas processuais ou honorĆ”rios advocatĆ­cios. Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C.

São Paulo, 08 de março de 2023. Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad Juiz de Direito

DJe - 10 de marƧo de 2023 – SP

Posts Em Destaque
Posts Recentes
Arquivo
Procurar por tags
bottom of page