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  • Isabel Sangali

Decisão SP: escritura pública, bens da sociedade para sócio, transmissão, imposto


Processo 1001918-81.2021.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Jairo Tacci – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 7º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Jairo Tacci, após negativa de registro de instrumento particular de desconstituição da proprietária Vic Copiadora Rápida EIRELI na matrícula de nº 29.982 da serventia. Aduz o Oficial que, sendo o valor do imóvel superior ao previsto no Art. 108 do CC, a desconstituição, por representar transferência do bem, deve ser feita por escritura pública, sendo que o instrumento particular somente é aceito para conferência de bens, e não desconstituição da pessoa jurídica. Aduz, ainda, que não haveria isenção do ITBI já que não houve desincorporação da pessoa jurídica com transferência do bem ao mesmo alienante, e que eventual isenção em razão da extinção da pessoa jurídica depende de reconhecimento administrativo de isenção. Documentos às fls. 06/38. O suscitado impugnou a dúvida às fls. 43/61. Argumenta, em síntese, que o instrumento particular de desconstituição da pessoa jurídica é suficiente para o registro da transferência dos bens aos sócios, aduzindo ainda que a certidão da Junta Comercial é instrumento público e supre a exigência do Art. 108 do CC e que não incide ITBI na operação realizada. Informações complementares do Oficial às fls. 70/72. O Ministério Público opinou às fls. 76/78 pela procedência da dúvida. É o relatório. Decido. Cito o decidido pelo então Corregedor Geral da Justiça Des. Pereira Calças no Proc. CG 170.381/2015, aprovando parecer do MM. Juiz Assessor Dr. Guilherme Stamillo Santarelli Zuliani: Não há como fugir da conclusão de que o ato jurídico realizado pelas partes terminou com a transferência do bem imóvel e, assim, deverá ser reconhecida a natureza translativa da transação, ainda que contra a vontade do recorrente, até porque a cláusula terceira menciona expressamente que o bem de propriedade da sociedade ficará em poder de pessoa distinta (sócio), o ora recorrente. Segundo CRISTIANO CHAVES e NELSON ROSELVALD. (Direito Civil, Teoria Geral, Ed. Lumen Juris, 6ª Edição, 2007, p. 266): “é possível afirmar que a nota distintiva da pessoa jurídica é a distinção entre o seu patrimônio e o dos seus instituidores, não se misturando a condição jurídica autonomamente conferida àquela entidade com a de quem lhe organizou”. Com efeito, o título apresentado à Serventia denota a existência da disposição translativa do domínio, pois os sócios dispuseram sobre a extinção da personalidade jurídica da sociedade, assim como sobre o destino do ativo, o que torna acertada a exigência de escritura pública como título hábil ao registro (art.1.245 do Código Civil), uma vez que, tratando-se de bem imóvel, a presença do ato notarial integra a própria substância do negócio jurídico, cuja inobservância acarreta sua invalidade, conforme inteligência do art. 166, IV do Código Civil. (…) O Código Civil adotou, como regra, o princípio do consensualismo e a liberdade da forma, conforme definido no art.107. No entanto, a nulidade e a inaptidão do título estarão presentes quando houver descumprimento da determinação legal para os casos específicos em que a forma especial figura como substância do negócio jurídico (ad solemnitatem), como no caso dos autos, eis que o instrumento particular, por versar também sobre a transferência de direitos reais, precisa ser materializado por escritura pública, sob pena de nulidade da própria disposição translativa, comprometendo-se, por conseguinte, o ingresso no fólio real. A questão da necessidade da forma pública é tratada com severidade pela jurisprudência do C. Conselho Superior da Magistratura, tanto que sua a obrigatoriedade passou a ser reconhecida também para o caso de compra e venda de parte ideal de imóvel cujo valor total supere o limite de 30 salários mínimos, mas a parte a ser alienada venha a ter valor inferior (Processo nº 1.088-6/0, de 15/07/2009, Desembargador Ruy Camilo). É certo que a intensa atividade legislativa consolidou inúmeras exceções à regra da exigibilidade da escritura pública para a instrumentalização de alguns negócios jurídicos, de modo a exigir a atuação sistemática dos Registradores e Juízes Corregedores. Assim, o art. 64 da Lei nº 8.934/94 permite que o sócio, munido de certidão expedida pela Junta Comercial, possa alienar direitos reais incidentes sobre imóveis, para fins de integralização do capital subscrito, o que não significa dizer que a permissão legislativa possa ser interpretada extensivamente para viabilizar a transferência de bens da sociedade em benefício do sócio, nos termos da jurisprudência do Colendo Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível nº 491-6/1, Serra Negra, julgamento em 11/05/2006, DJ 12/07/2006, Relator Desembargador GILBERTO PASSOS DE FREITAS). Noutras palavras, já se decidiu: “Admite-se a utilização de instrumento particular com o fim de materializar a conferência de bens pelos sócios para integralizar o capital social, mas tal exceção, derivada do texto do art. 64 da lei fed. nº 8.934/94, deve ser interpretada de modo restritivo. Tal dispositivo legal permite a utilização de certidão expedida pela Junta Comercial, extraída dos atos constitutivos ou de sua alteração, como título hábil para, perante o registrador, possibilitar a alienação de direitos reais incidentes sobre imóveis, mas sempre, invariavelmente, para a composição ou o aumento do capital social e nunca, para sua redução ou dissolução” (Ap. Cív. nº 63.971-0/1 – Capital, j. 28.10.99, rel. Des. NIGRO CONCEIÇÃO). E o mesmo entendimento deve ser trazido ao presente feito. O imóvel, conforme o R. 06 da Matrícula nº 29.982 (fls. 19/21) é de propriedade da pessoa jurídica Vic Copiadora Rápida Eireli. As quotas sociais da EIRELI pertenciam a Vicenta Di Fátima Ippolito e, após seu falecimento e regular partilha, passaram a pertencer a Jairo Tacci e Alessandro Tacci, na proporção de 50% para cada um. Disso não decorre que o imóvel passou a pertecer a Jairo e Alessandro. O imóvel é de propriedade de Vic Copiadora, cujos sócios são Jairo e Alessandro. Se, após a aquisição das quotas, os sócios extinguiram a pessoa jurídica conforme instrumento de fls. 25/29 e 64/66, necessário se faz a regular liquidação da sociedade, com a transferência de seu patrimônio, seja a credores, seja aos sócios, na proporção de sua participação societária. E se tal patrimônio é composto por bem imóvel com valor superior a 30 salários mínimos, a escritura pública é forma essencial para validade de sua transferência, nos termos do Art. 108 do Código Civil. Tal artigo permite exceções, devendo estas estarem previstas em lei. E, aqui, não há lei permissiva de que tal transferência se dê por instrumento particular. Como dito no precedente, o Art. 64 da Lei nº 8.934/94 torna documento hábil para transferência a certidão da junta comercial “dos bens com que o subscritor tiver contribuído para a formação ou aumento do capital social”. No presente caso, contudo, não se trata de aumento ou formação de capital social, mas transferência de seu patrimônio aos sócios em razão de sua desconstituiçao. Assim, fundamental que tal transferência se dê por escritura pública. E escritura pública é o documento lavrado por Tabelião de Notas, não se confundindo com “instrumento público”, como é o caso das certidões da Junta Comercial. Assim, deverá ser lavrada tal escritura em que a pessoa jurídica Vic Copiadora, representada por seus sócios, transfere a eles seu patrimônio, ainda que em razão de liquidação. E, para o registro de tal escritura, deverá ser comprovado o pagamento de tributo incidente ou, em caso de isenção, a certidão emitida pelo Fisco atestando que a operação jurídica é isenta, já que não cabe ao registrador reconhecer a isenção e, havendo transferência de propriedade, presume-se a incidência de tributo, cabendo ao Fisco, por meio da certidão competente, afastar tal presunção e reconhecer a existência de hipótese de isenção ou não incidência. Veja-se, ainda, que a forma do contrato de fls. 64/66 torna ainda mais dúbia a existência de isenção, já que o imóvel não foi transferido aos sócios na proporção das quotas, e sim transferido integralmente a um dos sócios que pagou ao outro a diferença em dinheiro, o que pode apontar, inclusive, pela existência de compra e venda já que, em tese, caberia 50% do imóvel a cada um dos sócios em razão da dissolução da pessoa jurídica. Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 7º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Jairo Tacci, mantendo o óbice ao registro. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. – ADV: MARINILDA GALLO (OAB 51158/SP) (DJe de 24.02.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

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