O dano à ordem urbanística, decorrente da implantação de loteamento irregular, é permanente e se pro
O dano à ordem urbanística, decorrente da implantação de loteamento irregular, é permanente e se protrai no tempo. Enquanto persistir a situação danosa, não há se falar em prescrição, porque o prazo se renova a cada ato.
Confira a seguir o pronunciamento judicial acerca deste tema relevante:
Nos loteamentos irregulares ou clandestinos, vão-se longos anos até que comecem a ser apontados títulos no registro de imóveis. As vendas são feitas com instrumentos particulares e os pagamentos, parcelados, em anos ou décadas. Alcançada a quitação, os adquirentes vão em busca da escritura pública, uma vez que não há possibilidade de registro translativo apenas com o instrumento particular. E não é incomum que tais escrituras nunca cheguem a ser lavradas, passados vinte ou trinta anos da compra, porque não se encontram os vendedores ou porque estes, simplesmente, recusam-se a outorgá-las. Isto faz com que a irregularidade possa passar longo período sem ser notada. Facilmente, cinco anos (o prazo prescricional) podem decorrer antes que se haja sinais evidentes da clandestinidade. Embora a conduta vedada seja a venda de lotes sem o prévio registro do parcelamento, o fato é que não são as vendas, em si, que caracterizam o dano urbanístico. O dano urbanístico se dá com a ocupação desordenada do território, com o ingresso paulatino de novos moradores que passam a exigir serviços públicos e aparelhos estatais, como escolas, postos de saúde, delegacias etc. O dano urbanístico não se concretiza de inopino ou numa data determinada. O dano, em casos de ocupação ilegal, é gradual, progressivo. O dano tem como causa imediata a ocupação desordenada, e como causa mediata, a venda de unidades em empreendimento, sem a prévia aprovação e sem que o empreender tenha realizado as obras de infraestrutura e transferido, ao município, os espaços que constituirão áreas de uso comum (ruas, avenidas, praças).
A conduta omissiva do empreendedor pode ser revertida a qualquer tempo. A regularização, em algum momento, pode e deve ser feita. Em último caso, deve ser providenciada pelo poder público.
Quer-se dizer que está dentro da esfera de decisão do empreendedor, mesmo depois de iniciadas vendas ilegais, a cessação de sua omissão e a tomada de providências de adequação à lei de parcelamento do solo. Uma sequência de atos pontuais, lesivos, constroem o dano urbanístico, considerado como um todo. Pelo Brasil afora, há inúmeros bairros e, às vezes, cidades inteiras formadas de maneira completamente irregular, ao longo de décadas, que acabam se tornando materialmente irreversíveis. Tais ocupações, se consideradas consolidadas e irreversíveis, autorizam a regularização nos moldes definidos na Lei 13.465/2017, que instituiu o procedimento denominado Reurb. E os proprietários e loteadores estão entre os legitimados para dar início ao processo administrativo de regularização.
Quando possível identificar o empreendedor ou titular da área, desse se podem cobrar providências e custeio para a regularização. Em qualquer dos casos, os entes públicos podem e devem providenciar a regularização. Contar o prazo de cinco anos, a partir e exclusivamente, do primeiro ato ilegal significa abrir campo para a imunidade aos maus empreendedores, que colherão os frutos das vendas dos lotes e transferirão para os entes públicos a ordenação física da área, implantação e custeio de serviços públicos e regularização registrária. Não se trata, propriamente, de imprescritibilidade, mas de renovação contínua do prazo prescricional, enquanto perdura a omissão do empreendedor (Acórdão TJ/SP, apelação nº 0027310-73.1998.8.26.0576, de 06/09/2019).
“A implantação de loteamento irregular envolve a venda de parcelas de uma gleba sem prévia aprovação e registro do loteamento, além da não observância das limitações ambientais e urbanísticas na implantação, prática continuada ao longo do tempo. As omissões são continuadas, por isso, tendo em vista que as pretensões veiculadas por meio dos pedidos são relativas ao descumprimento das obrigações relativas ao parcelamento do solo e posturas urbanísticas, tais condutas são consideradas infrações omissivas de caráter permanente (STJ, 2ª Turma, AgRg no Ag nº 928652, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, j. 21.2.2008, DJe 13.11.2009), o que afasta a prescrição”.